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N de Nordeste

Isabela Seifarth
20/04/2022 a 28/05/2022

Release
A partir de 20 de abril às 19 horas, a RV Cultura e Arte apresenta N de Nordeste, exposição individual da artista baiana Isabela Seifarth, com texto de Bitu Cassundé.

A exposição dá continuidade à pesquisa da artista relacionada a cenas do Recôncavo Baiano, apresentando pinturas produzidas entre 2020 e 2022 que adotam como referência fotografias do Arquivo Público da cidade de São Félix, além de registros cotidianos realizados por Isabela. “A exposição apresenta um conjunto de pinturas que discute questões relacionadas ao território, lugar e o entorno, evidenciando o Recôncavo Baiano, nos trânsitos e deslocamentos da artista por essa singular região do Nordeste brasileiro. São imagens e percepções da intimidade, do urbano, deslocadas e reestruturadas dentro de uma lógica cartográfica que aciona uma natureza ficcional e elabora um instigante convívio entre distintos mundos, geografias e cores. Nesta série de pinturas a jovem artista Isabela Seifarth mostra fragmentos de um Nordeste vibrante, que se posiciona nas suas diferenças e potências”, analisa o curador e pesquisador Bitu Cassundé.

Visualmente, as obras de Isabela propõem um adensamento de pessoas, objetos e cores, que representam mais que o recôncavo, uma estética presente na experiência coletiva de Nordeste. Entre bares, barbearias, feiras livres e a zona rural, a artista constrói um repertório de imagens dividido em duas paletas de cores distintas. “O uso das cores é uma parte fundamental na minha obra. Se antes eu estava trabalhando muito a partir de cores primárias, sempre com vermelho, azul e amarelo, ao longo da produção para essa mostra eu consegui explorar outras possibilidades, trazendo cores mais intensas para as cenas de cidade e tons mais claros para representar o campo, a lida com o boi, a vaquejada. É como se a cidade precisasse de cores mais quentes porque ela vibra, enquanto no campo as cores tendem ao pastel porque as coisas estão mais calmas, mais serenas”, comenta a artista.

Em paralelo à exposição em Salvador, Isabela também apresenta “ABC do Nordeste”, no Mercado Municipal de São Félix. Composta em acrílica sobre tecido de algodão cru, a instalação reúne, a partir da representação da casca da laranja - ligada às simpatias de São João - palavras associadas à cultura e tradições do Nordeste, de A à Z, formando então um grande abecedário e propondo uma ocupação da parte superior do vão livre do Mercado. A montagem é uma iniciativa para ativar o espaço público do prédio tombado de 1902, em uma espécie de metalinguagem, fazendo com que o público possa integrar a obra e de alguma maneira se ver também representado nela. A abertura no Mercado Municipal acontece no dia 23 de abril às 09 horas.

N de Nordeste pode ser visitada até 28 de maio de 2022 presencialmente na RV Cultura e Arte - de segunda a sexta, das 10:00 às 18:00 e aos sábados das 10:00 às 14:00; e de forma online, pelo site da galeria (www.rvculturaearte.com). Já a instalação no Mercado Municipal de São Félix fica aberta à visitação de segunda a sábado das 07:00 às 19:00.


Texto crítico

As geografias se interessam pelo espaço e reconfiguram a instância relacional entre o meio e a sociedade. É um processo, algo que se transforma e reorganiza territórios e corpos. Existe sempre um Norte, que direciona e agencia esses desejos, cartografando práticas na construção de novos mundos, possíveis e impossíveis, reais e ficcionais. Fabular mundos, cartografar performatividades, instaurar outros arquivos, requer o sinuoso gesto de atravessar algo de dentro para fora, que revela ou reflete, como num espelho, ao aprisionar e encantar uma imagem. Esses territórios com suas singulares geografias nos afetam e nos seduzem, seja pela coreografia que o povo lapida naquele espaço — através da cultura, dos rituais de fé, dos sabores e dos cheiros — ou do corpo com seus ritmos sedutores.

Um desses territórios encantados que compõe o Nordeste brasileiro é o Recôncavo Baiano, localizado em torno da Baía de Todos-os-Santos, cujo formato côncavo acolhe essa fértil região da Bahia. É nessa dimensão que a artista Isabela Seifarth desenvolve a sua pesquisa poética, tendo o território, o lugar, o entorno, como eixos fundamentais na sua recente produção: uma série de pinturas produzidas a partir de 2020 e que compõe esse significativo conjunto para exposição N de Nordeste.

A pesquisa tem como lugar primeiro o Arquivo Público da cidade de São Félix (BA). Esses documentos e imagens funcionam como pontos de partida para um mergulho na vasta documentação preservada naquele espaço. O cotidiano é registrado como um potente instrumento ou índice para a elaboração e reelaboração das imagens e, nesse sentido, as fotografias revelam diferentes Nortes. Assim, constroem e acionam distintos universos, ativando narrativas entre o presente e o passado, por meio de tradições religiosas, feiras, bares, barbearias, o urbano e o rural.

Seifarth elabora com muita precisão essa junção de mundos, e novas cartografias se configuram através de mapas, selos, números, índices taxonômicos que são ativados pela intensidade do arquivo que acondicionam as memórias e as tradições dessa rica região do Nordeste brasileiro. Essas referências fluem diretamente no universo visual construído pela artista, que se apropria de referências como o Mapa do Recôncavo, feito pelo engenheiro Teodoro Sampaio, em 1899, e é justamente sobre essa paisagem social que um elemento percorre a grande maioria das pinturas, uma moldura que evidencia um fragmento da imagem.

Moldura, espelho, mapa, bandeira, corpo, feira, rural, urbano, Santo Amaro, São Félix, Cachoeira, diferentes construções instigam um vocabulário visual que imprime na pintura de Seifarth um Recôncavo afetivo, com sobreposições que desafiam o real e propõe um novo imaginário, repleto de tradições, de magias. Também as simpatias habitam esse lugar, por exemplo, durante a noite de São João, que, ao descascar uma laranja numa tira só e jogá-la para trás, a letra que se forma com a casca indica o nome do seu futuro namorado. N de um Nordeste amoroso!

Bitu Cassundé



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