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As geografias se interessam pelo espaço e reconfiguram a instância relacional entre o meio e a sociedade. É um processo, algo que se transforma e reorganiza territórios e corpos. Existe sempre um Norte, que direciona e agencia esses desejos, cartografando práticas na construção de novos mundos, possíveis e impossíveis, reais e ficcionais. Fabular mundos, cartografar performatividades, instaurar outros arquivos, requer o sinuoso gesto de atravessar algo de dentro para fora, que revela ou reflete, como num espelho, ao aprisionar e encantar uma imagem. Esses territórios com suas singulares geografias nos afetam e nos seduzem, seja pela coreografia que o povo lapida naquele espaço — através da cultura, dos rituais de fé, dos sabores e dos cheiros — ou do corpo com seus ritmos sedutores.

Um desses territórios encantados que compõe o Nordeste brasileiro é o Recôncavo Baiano, localizado em torno da Baía de Todos-os-Santos, cujo formato côncavo acolhe essa fértil região da Bahia. É nessa dimensão que a artista Isabela Seifarth desenvolve a sua pesquisa poética, tendo o território, o lugar, o entorno, como eixos fundamentais na sua recente produção: uma série de pinturas produzidas a partir de 2020 e que compõe esse significativo conjunto para exposição N de Nordeste.

A pesquisa tem como lugar primeiro o Arquivo Público da cidade de São Félix (BA). Esses documentos e imagens funcionam como pontos de partida para um mergulho na vasta documentação preservada naquele espaço. O cotidiano é registrado como um potente instrumento ou índice para a elaboração e reelaboração das imagens e, nesse sentido, as fotografias revelam diferentes Nortes. Assim, constroem e acionam distintos universos, ativando narrativas entre o presente e o passado, por meio de tradições religiosas, feiras, bares, barbearias, o urbano e o rural.
Seifarth elabora com muita precisão essa junção de mundos, e novas cartografias se configuram através de mapas, selos, números, índices taxonômicos que são ativados pela intensidade do arquivo que acondicionam as memórias e as tradições dessa rica região do Nordeste brasileiro. Essas referências fluem diretamente no universo visual construído pela artista, que se apropria de referências como o Mapa do Recôncavo, feito pelo engenheiro Teodoro Sampaio, em 1899, e é justamente sobre essa paisagem social que um elemento percorre a grande maioria das pinturas, uma moldura que evidencia um fragmento da imagem.

Moldura, espelho, mapa, bandeira, corpo, feira, rural, urbano, Santo Amaro, São Félix, Cachoeira, diferentes construções instigam um vocabulário visual que imprime na pintura de Seifarth um Recôncavo afetivo, com sobreposições que desafiam o real e propõe um novo imaginário, repleto de tradições, de magias. Também as simpatias habitam esse lugar, por exemplo, durante a noite de São João, que, ao descascar uma laranja numa tira só e jogá-la para trás, a letra que se forma com a casca indica o nome do seu futuro namorado. N de um Nordeste amoroso!

Bitu Cassundé

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