Letícia Lampert

Porto Alegre, 1978
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Com formação em Artes Visuais, Design e mestrado em Poéticas Visuais, Letícia Lampert vem desenvolvendo sua produção autoral principalmente através da fotografia. Tem como eixo principal de pesquisa a investigação sobre as formas de compreender a paisagem, especialmente urbana, e as relações, mediadas pela arquitetura, que estabelecemos com as cidades.

Participa regularmente de exposições no Brasil e exterior e teve seu trabalho destacado em salões e prêmios tais como o Prêmio Açoriano de Artes Plásticas – Fotografia, em 2009, Prêmio Nacional de Fotografia Pierre Verger, em 2013, o Prêmio Chico Albuquerque de Fotografia, em 2019, entre outros. Em 2018, participou da Bienal do Mercosul, em Porto Alegre, da Bienal de Fotografia de Beijing, na China, e foi também finalista do Prêmio Fola, em Buenos Aires – Argentina. Participou de residências artísticas no Brasil e no exterior, sendo elas The Swatch Art Peace Hotel, em Xangai – China, Residência Artística FAAP e Hermes, em São Paulo, Kaaysá, em Boiçucanga e Pier2, em Kaohsiung – Taiwan.

Publicou até o momento três livros: a Escala de Cor das Coisas (2009), 拆 [chai] (2016) e Conhecidos de Vista (Incompleta, 2018). 
Graduated in Graphic Design and Visual Arts and with an MFA in Visual Poetics, Letícia Lampert has been developing her authorial production mainly through photography. Her work is focused on ways of understanding the landscape, especially in an urban environment, and how architecture mediates our relationship with cities.

She regularly participates in exhibitions in Brazil and abroad and had her work highlighted in salons and awards such as Prêmio Açoriano de Artes Plásticas – Fotografia, in 2009; Prêmio Nacional de Fotografia Pierre Verger, in 2013; and Prêmio Chico Albuquerque de Fotografia, in 2019, among others. In 2018, she participated in Bienal do Mercosul, in Brazil, Beijing Photo Biennial, in China, and was one of the finalists at Felila Fola International Prize, in Argentina. She has participated in art residencies as The Swatch Art Peace Hotel in Shanghai, China; FAAP Art Residency and Hermes, in Sao Paulo, Brazil; Kaaysá, in Boiçucanga, Brazil; and Pier2, at Kaohsiung, Taiwan.

Leticia has also published three book since 2009: Escala de Cor das Coisas, 拆 [chai) and Conhecidos de Vista.


Obras disponíveis






Destrinchar, recortar, medir, organizar e compor são verbos que fazem parte do vocabulário poético de Letícia Lampert. O desejo de compreender a relação entre o olhar e aquilo que nos cerca diariamente aparece em sua produção através de variadas composições e tipologias – por vezes paisagens mínimas e delicadas, por outras cidades que ganham corpo a partir de sua criteriosa elaboração.

Nos trabalhos aqui apresentados, a urbe é o impulso e o palco para as suas experimentações. A fotografia, o seu modo de operar, seu instrumento. É a partir da imagem que a cidade se torna palpável. É possível, então, experimentar a paisagem. Ao desfazer a cena, Letícia busca compreender a composição aglomerada que forma as cidades contemporâneas. Em suas imagens, a falta de perspectiva e espaço entre os prédios, janelas vizinhas quase coladas, reduzidas áreas verdes e o pouco espaço que sobra para vermos o céu, denunciam o crescimento acelerado e sem planejamento dos centros urbanos. Propositalmente uma cidade sem nome, que pode ser qualquer uma e todas ao mesmo tempo.
O excesso de caos a que já estamos acostumados ganha, assim, uma nova dimensão, divertida e sensível. Ao subtrair, Letícia salienta, ao compor, satura, fazendo emergir pontos de atenção, aqueles mesmos que passam batido em meio a correria diária. O exercício de olhar para a cidade torna-se então um exercício para aprender a ver melhor, como um quebra-cabeças que em sua montagem nos ensina sobre a composição e apenas pronto nos permite ver o todo.

Luíza Keffer, março 2018


A ideia de que ver é sempre algo à distância, é sempre uma experiência que não alcançamos plenamente, no sentido de não ser algo palpável, mas apenas sensível, é uma das coisas que move a poética de Letícia Lampert. Sua busca, enquanto artista, centra-se, sobretudo, na relação do ver com a paisagem e com o outro. Como é possível estabelecer uma relação com as coisas que nos rodeiam? Com tudo aquilo que olhamos e guardamos em imagens?

Para o fotógrafo e crítico americano Robert Adams, uma das funções das imagens de paisagem seria permitir a redescoberta e a reavaliação de onde nós nos encontramos. “Acho que confiamos na fotografia de paisagem para tornar inteligível para nós aquilo que já sabemos”[1], escreve. No exercício constante de olhar e re-olhar, de procurar tons e nuances, de tornar visível e, talvez um pouco mais próximo, aquilo que está apenas ao alcance do olhar, Letícia coleciona cores e paisagens. Com sua câmera fotográfica, congela e retém tudo aquilo que lhe interessa, numa ânsia de compreender, através da imagem, o cenário complexo em que vivemos.

Em Exercícios para perder de vista, Letícia apresenta trabalhos produzidos entre 2015 e 2017, na China e no litoral do Rio Grande do Sul, que colocam em questão justamente a distância entre o ver e o sentir, entre o ver físico e o ver na imagem. Nas obras aqui apresentadas, a paleta de cores da artista se reduz, concentrando-se sobretudo nos tons de cinza, bege e branco de fotografias capturadas em paisagens urbanas e naturais recobertas ora por névoa, ora por poluição. Ao voltar-se para tons mínimos e ressaltar as diferenças sutis na passagem de um para o outro, procura as variações mais finas, sensíveis ao olho, revelando uma paisagem ao mesmo tempo complexa e sutil.

Intercalando blocos de cor e blocos de imagem, a artista brinca com a veracidade e a verossimilhança dos tons, daquilo que é possível ver em meio a quase nada, jogando com a percepção do público. Convidando o espectador à contemplação e à reflexão sobre o mundo que nos rodeia, Letícia aproxima-o da distância que está sempre envolvida no olhar, tornando-a sutilmente palpável por meio da sua gradação de cores mínimas e delicadas. Quase como se nos indicasse um caminho pelo qual poderíamos alcançar a paisagem. Os trabalhos que integram Exercícios para perder de vista criam, assim, um catálogo de matizes que compõem o mundo ao nosso redor e estruturam o nosso olhar. Nestas obras, pela composição e pelo silêncio das imagens, o matiz mais mínimo adquire o seu máximo.

Em 1985, o fotógrafo Luigi Ghirri escreve que “é necessário encontrar um método para organizar o olhar nesse mundo sem fronteiras, fragmentado e veloz”, é preciso encontrar uma forma de reativar o olhar para que ele possa “não ser mais inerte diante de um mundo cada vez mais incompreensível e complexo”[2]. Com sua tênue escala de cores, penso ser precisamente este exercício que Letícia nos propõe.

Se Ghirri, naquele momento, se referia às novas demandas do olhar trazidas pelo filme, pela televisão e pelo aumento do consumo de imagens eletrônicas, é preciso situar que de lá para cá, a quantidade de imagens que nos rodeiam multiplicou-se e segue crescendo em progressão geométrica. Nos acostumamos a produzir e consumir imagens em tempo quase integral. Vivemos imersos em uma sociedade baseada na imagem. Nesse contexto, pensar sobre a importância do olhar é uma tarefa necessária. As imagens construídas por Letícia são, assim, um convite sensível para passearmos sobre os tons que velam e desvelam as paisagens urbanas e naturais que nos rodeiam, se tornando, também, uma prazerosa brincadeira de medirmos a cor da paisagem.

Exercícios para perder de vista propõe ao espectador que ele tente afinar o seu olhar, resgatando a calma e a capacidade de encontrar no silêncio e no estático uma gama infinita de cores e movimentos.  Ao se entregar a contemplação talvez seja possível diminuir a distância entre o olhar e o sentir, e a visão, assim, deixe de ser um exercício sempre à distância.

Luíza Keffer para a exposição Exercícios para perder de vista, Galeria Mamute, 2017


[1] ADAMS, Robert. Beauty in Photography. New York: Aperture, 1981. p.16-20.
[2] GHIRRI, Luigi. Complete Essays. London: Mack Books, 2016. p.91-92.


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