BONITA É A NOITE COM SUA FUNDURA

27 SET - 22 NOV

Curadoria:
Tarcisio Almeida e George Teles

Artistas:
Alíson Souza, Allan Da Silva, Ema Ribeiro, Dani de Iracema, Dayane Ribeiro, George Teles, Jamile Cazumbá, Kaick Rodrigues, Larissa Neres, Lucimélia Romão, Marcos da Matta, Milena Ferreira e Rafael Ramos.


NO ESCURO, TUDO CINTILA
“Esses trabalhos são como um sonhar acordado, uma disposição à fantasia dentro de um estado de vigília”, afirma Henrique Reis (1995) sobre sua mais recente série de pinturas. Vigília, estado voluntário de alerta e privação de sono em horários onde é natural dormir, intitula a sua primeira exposição individual na RV Cultura e Arte em Salvador. Desde 2024, o artista de Macajuba, município do semiárido baiano, e radicado na capital baiana, tem se dedicado a construir imagens noturnas que investigam a sexualidade masculina em espaços públicos, especialmente através do cruising, prática de busca por encontros casuais em parques, praças e matas. Seu trabalho ficcionaliza cenas a partir da vivência dos gatunos que se esgueiram pelas trilhas subterrâneas da cidade.

Observamos os quadros em acrílica como se, agachados por detrás de uma moita, tivéssemos, como seus personagens, perambulado pelo bosque. São visões sonâmbulas de anônimos excitados pelo proibido a transformar interdição em fetiche. Em Mamoeiro, um trio ocupa a metade esquerda da tela. Ignora a luz dura que lambe seus corpos, fazendo-os saltar do mato escuro e amorfo. É impossível olhar para a composição na cadeia de gestos de prazer e não lembrar dos dirty drawings do cartunista Tom of Finland (1920–1991), feitos entre as décadas de 1940 e 60, nos quais homens hiper masculinizados, sempre abertos ao prazer e sempre dotados de ternura, disputam o espaço público.

A figuração de Henrique Reis tende a ser mais realista do que a do ilustrador finlandês, trazendo como exceção a figura de um felino que se afasta furtivamente da cena sem deixar de espiá-la. A criatura, transplantada de uma iluminura medieval, carrega entre os dentes um falo. Alva, com espesso contorno negro, nem ilumina o ambiente nem se deixa ser engolida por sua escuridão, acrescentando uma camada de delírio ao trabalho com sua visualidade estrangeira.

Única a apresentar elementos em cena para além de fauna e flora trepidantes, em Amêndoas, um homem enterra seu rosto nas pernas de outro. Sentados em um banco de praça iluminado por um poste, eles são retratados em posições despojadas, conferindo uma crueza à cena menos explícita.
Em alguns trabalhos, os corpos retratados se aproximam ao físico cultuado presente nas fotografias do fluminense Alair Gomes (1921–1992), autor de séries de acentuado caráter voyeurístico. Gomes mostra rapazes musculosos em momentos de lazer ou se exercitando na praia, fotografados de seu apartamento. O sol é rebatido pela areia, isolando a cena e conferindo uma brancura artificial que neutraliza o ambiente e realça os retratados. Henrique Reis faz o oposto: não isola, mas dissolve no breu os corpos que pinta.

O couro, elemento importante na produção do artista, retorna para o seu trabalho nesta exposição. Em Montaria, é possível conferir as costas sinuosas de um homem, tatuadas com uma imagem clássica de São Jorge: no dorso de um cavalo rampante, empunhando sua lança e prestes a perfurar um dragão. O couro alude à cultura BDSM ou aos leathermen, mas está cravejado de miçangas brancas e medalhinhas do padroeiro dos cavaleiros que conferem delicadeza à peça. Elas, juntamente ao pelo na pele espalmada, trazem uma dimensão háptica à obra. Essa mistura entre erotismo e religiosidade é uma constante na visualidade fetichista, onde sofrimento, poder e desejo se combinam.

Em Bananeiras, dois homens se beijam. Seus corpos estão imersos na água. Trêmula, ela nos impede de ver o que fazem. O bananal que os rodeia é lavado por uma luz dura como as do fotógrafo japonês Kohei Yoshiyuki (1946–2022), que, com infravermelho e flash, embaralhava as posições de participante e espectador ao registrar atividades sexuais noturnas nos parques de Tóquio. As cenas de Henrique Reis suscitam em nós a posição de voyeurs enquanto presenças fora do plano: ao olhá-las da nossa fresta, somos cúmplices da fantasia. Contudo, possuem uma diferença fundamental das fotografias de Yoshiyuki: são pinturas, tinta sobre tela.

Henrique Reis não documenta, costura, com sua pintura sonâmbula, experiências vividas e sonhadas por aqueles cujos desejos são represados à luz do dia e que forjam o prazer em encontros tensos, marginais e possíveis quando embrenhados na noite.

Jamile Cazumbá




Refletida como o sol, diante do que não se apaga
Day Ribeiro

performance
200x300cm
2022


Bifurcações, série Línguas
Allan da silva

conjunto de cinco esculturas em cerâmica de alta temperatura
18x4cm cada
2024


sem título 1, série Banhos de Sol
George Teles

bastão de óleo sobre tela
170x150cm
2025


O inaugurado
Allan da Silva 

escultura cerâmica de alta temperatura
100x86x8,5cm
2024


Rachaduras são rompimento das arestas
Larissa Neres

fibra sintética e fio elástico
dimensões variáveis
2025


sem título 2, série Banhos de Sol
George Teles

bastão de óleo sobre tela
130x100cm
2025


Fresta
Henrique Reis

acrílica sobre tela
95x78cm
2025


Fresta
Henrique Reis

acrílica sobre tela
95x78cm
2025


Fresta
Henrique Reis

acrílica sobre tela
95x78cm
2025


Fresta
Henrique Reis

acrílica sobre tela
95x78cm
2025


Fresta
Henrique Reis

acrílica sobre tela
95x78cm
2025


Fresta
Henrique Reis

acrílica sobre tela
95x78cm
2025


Fresta
Henrique Reis

acrílica sobre tela
95x78cm
2025


Fresta
Henrique Reis

acrílica sobre tela
95x78cm
2025


Fresta
Henrique Reis

acrílica sobre tela
95x78cm
2025


Fresta
Henrique Reis

acrílica sobre tela
95x78cm
2025


Fresta
Henrique Reis

acrílica sobre tela
95x78cm
2025


Fresta
Henrique Reis

acrílica sobre tela
95x78cm
2025


Fresta
Henrique Reis

acrílica sobre tela
95x78cm
2025


Fresta
Henrique Reis

acrílica sobre tela
95x78cm
2025


ÁLISON SOUZA

(Macajuba, 1995)

É artista visual e pesquisador, vive entre Itatim e Cachoeira (BA). Graduando em Artes Visuais pela UFRB, investiga pintura, escultura e gravura a partir da comunidade rural Ponta Aguda, onde cresceu. Suas obras partem de memórias afetivas e coletivas, explorando a representação do espaço rural e as relações cultivadas no território, compondo uma poética de pertencimento e resistência.

ALLAN DA SILVA

(Macajuba, 1995)

É artista visual, pesquisador e diretor de arte, nasceu em Jaguaripe (BA), onde vive. Graduado em Artes Visuais pela UFRB, sua pesquisa atravessa ecologia, barro e tradições do Recôncavo, articulando cerâmica, instalação, vídeo e performance. Dialoga com mestres carpinteiros e tecnologias locais, compreendendo colaboração como método de permanência e o barro como memória vital e fundamento da vida.

DANI DE IRACEMA

(Macajuba, 1995)

É artista do corpo, da imagem e da palavra, vive em Salvador (BA). Licenciada em dança pela UFBA, desenvolve trabalhos entre arte contemporânea e culturas tradicionais afrodiaspóricas como samba de roda e capoeira angola. Sua pesquisa investiga ritualidades, migrações e memórias em processos autobiográficos, articulando criação e pedagogia como modos de afirmar pertencimento e resistência cultural.

DAYANE RIBEIRO SANTOS

(Macajuba, 1995)

É artista visual e da cena, performer, arte-educadora e pesquisadora. Bacharela em Humanidades pela UNILAB e mestranda em Artes da Cena na UNICAMP, atua no cruzamento entre teatro físico, performance, dança afro-brasileira e culturas populares. Compreende o corpo como território social, político e poético, investigando as múltiplas contribuições da afrodiáspora na arte contemporânea e na criação.

EMA RIBEIRO

(Macajuba, 1995)

É artista visual nascida em Salvador (BA), atua com fotografia, fotoperformance, filmes-ensaio e ilustrações digitais. Sua pesquisa investiga a escuridão e a penumbra como potências poéticas, tensionando memória, presença e fabulação. Reelabora narrativas a partir da amefricanidade, construindo imagens que desestabilizam linearidades do tempo e expandem modos de existência em múltiplos suportes.

GEORGE TELES

(Feira de Santana, 1996)

É artista visual e pesquisador, vive entre Feira de Santana e Salvador (BA). Sua produção transita entre desenho, gravura e pintura, atualmente voltada às impressões contemporâneas. Pesquisa memória, corpo e deslocamento, explorando como encontros com territórios expandem a gravura e a pintura em direção à agência das materialidades. Seu trabalho propõe diálogos entre técnica e experiência sensível.

JAMILE CAZUMBÁ

(Macajuba, 1995)

É multiartista que atua entre artes visuais, cênicas, literatura e cinema. Investiga memórias inscritas nos corpos de mulheres negras em diálogo com performance e curadoria. É fundadora do Instituto Práticas Desobedientes, estudante de Museologia pela UFRB e integrante do Coletivo Angela Davis. Sua trajetória cruza teatro, audiovisual e artes visuais, criando rituais de presença, memória e invenção.

KAICK RODRIGUES (CALIBAN)

(Macajuba, 1995)

É artista visual de Camamu (BA), graduado em Artes Visuais pela UFRB. Transita entre fotografia, performance, direção criativa e vídeo mapping. Sua pesquisa é atravessada pelo dendê e pelo cacau, símbolos de fé, tradição e resistência no baixo sul baiano. Explora a fé como dispositivo ontoepistêmico, criando narrativas visuais que ritualizam o cotidiano e dão forma ao que emerge entre luz e penumbra.

LARISSA NERES

(Macajuba, 1995)

É artista visual de Valença (BA), vive em Cachoeira (BA). Graduada em Artes Visuais pela UFRB, também atua como cantora, trancista e professora de balé. Sua pesquisa parte da experiência como trancista, transformando fios em esculturas que reúnem histórias pessoais e coletivas. Investiga estética, autoestima e memória através das tranças, elaborando obras que entrelaçam corpo, identidade e território.

LUCIMÉLIA ROMÃO

(Macajuba, 1995)

É multiartista que transita entre artes visuais e cênicas, amalgamando linguagens para afirmar a vida em contextos de negação. Sua prática critica a continuidade colonial no Brasil e expõe como corpos e subjetividades são reiteradamente silenciados pelas estruturas sociais e legais. Seu trabalho atua como resistência estética e política, elaborando espaços de presença e de insurgência poética.

MARCOS DA MATTA

(Conceição do Almeida, 1989)

É artista visual de Conceição do Almeida (BA), vive em Cachoeira (BA), onde se graduou em Artes Visuais pela UFRB. Sua pesquisa parte do cotidiano do Recôncavo, atravessado por religiões, trabalhos informais e memórias coletivas. Suas obras articulam identidade e experiência compartilhada, explorando como elementos da cultura local moldam tanto sua trajetória quanto imaginários coletivos.

MILENA FERREIRA

(Salvador, 1992)

É artista visual, mestranda em Artes Visuais pela UFBA, vive em Salvador (BA). Pesquisa gravura em diálogo com pintura, escultura e instalação, tendo a estética da ruína como referência de memória e pertencimento. Seu trabalho investiga como ruínas participam da construção da coletividade, do território e das identidades, criando imagens que situam a fragilidade como potência estética e política.

RAFAEL RAMOS

(Macajuba, 1995)

É artista visual, diretor e fotógrafo, mestrando em Artes Visuais pela UFBA. Atua entre audiovisual e artes visuais, criando imagens a partir dos encontros com territórios familiares e urbanos. Sua pesquisa investiga a memória e a cidade, entrecruzando fotografia e intervenção para refletir sobre como novos imaginários são fabricados em espaços à margem da cidade dita formal.
INFO   
NEWSLETTER     WHATSAPP     EMAIL     INSTAGRAM