Release
A partir do dia 07 de dezembro a RV Cultura e Arte apresenta Atlântida, a primeira exposição
individual da artista baiana Vânia Medeiros.
Morando em São Paulo, Vânia volta a Salvador para uma mostra que reúne trabalhos produzidos
principalmente em 2016, e nos quais apresenta os resultados de suas pesquisas mais recentes.
Em andanças por diferentes cidades, que inclusive já motivaram as publicações “Férias” e “Férias
2” (Conspire Edições, 2016), a artista recria percursos e paisagens, transformando suas
experiências sensoriais em desenhos, instalações e objetos. Para Atlântida, foram selecionadas
obras em que Vânia recria ilhas geométricas em meio a um bloco denso de cores e texturas,
reinventa cartografias através de desenhos ou objetos, e ainda convida o espectador a elaborar
suas próprias paisagens urbanas.
Na análise da artista e pesquisadora Thais Graciotti – que assina o texto da mostra - “Aqui
estamos: neste arquipélago de rotas e propostas de viagens diversas, mais do domínio da
intensidade do que da extensão, Vânia Medeiros fez emergir com a força de seu traço e seu
corpo no espaço percorrido, não uma cidade utópica do fundo do mar, mas caminhos fantásticos
e diversos que nos promovem em deriva, um corpo-olho. Cada movimento é uma descoberta”.
A exposição pode ser visitada até 18 de fevereiro, com entrada gratuita.
Sobre a artista
Vânia Medeiros é artista visual e editora independente.
Foi criada em Salvador, Bahia e atualmente reside em São Paulo. Investiga o desenho como
forma de expressão em diversos suportes e formatos. Seu trabalho realiza-se através de ações
no espaço e processos colaborativos, ganhando materialidade na forma de livros, exposições,
instalações e intervenções urbanas.
Além de seus projetos pessoais, tem desenvolvido processos junto ao Coletivo Dodecafônico e
faz a coordenação editorial da plataforma Conspire Edições. Realiza também trabalhos de
ilustração, design e direção de arte com editoras, instituições e grupos diversos.
É formada em jornalismo pela Faculdade de Comunicação da Universidade Federal da Bahia
(2007), pós-graduada em artes no Instituto Universitário Nacional del Arte de Buenos Aires
(2008) e atualmente desenvolve um mestrado na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da
Universidade de São Paulo, no qual investiga cartografias subjetivas e formas de expressar
graficamente as experiências do corpo caminhante na cidade.
De súbito, um caminho.
Por vezes, o que parece único é plural, o que é plural será ainda mais. Aqui, os caminhos que eternamente se bifurcam, possuem um tênue equilíbrio entre a aproximação e a distância. Uma fantasia, diriam alguns. Outros contam que Platão soprou aos ouvidos dos mares distantes histórias sobre a existência desse lugar. Não é menos verdade, contudo, que neste mundo, que são muitos, o tempo escorre, tangente à velocidade das transformações contemporâneas da paisagem.Porém, o que importa é o desvio.
Ao olhar para um lado e para o outro, percebemos, deambulantes, que por puro acaso, ou por sorte, estamos entre linhas que traçam fragmentos de caminhos que delineiam nosso olhar em um registro gráfico de movimentos entre a presença e a ausência.
Mapeamento de rastos de todo o vivido e acontecido nessa história sobre o trânsito de ser no tempo e a sua passagem pelos espaços.
Mas lembrem-se, derivar é verbo presente.
Norte? Sul? Não importa, não estamos tratando de direção, mas de um convite à experimentação da erraticidade imanente do pensamento. Para além de horizontes históricos, ilhas brotam, icebergs fervem, cores explodem. Esse mundo-arquipélago certamente é feito de forma difusa, vaga, incerta, flutuante, pois estamos entre caminhos, no meio, água, mar, gelo, fogo.
Contudo, caminhos imprecisos também praticam a solidez das pedras na escritura que pulsa um corpo irreprimível em ação.
Trata-se de uma atividade incansável em exercitar um desmanchamento de si com a prudência necessária ao se compor, decompor e recompor.
Um senhor chamado Proust disse certa vez que a verdadeira viagem de descoberta não consiste em ir a novos lugares, mas em ter outros olhos.
Aqui estamos: neste arquipélago de rotas e propostas de viagens diversas, mais do domínio da intensidade do que da extensão, Vânia Medeiros fez emergir com a força de seu traço e seu corpo no espaço percorrido, não uma cidade utópica do fundo do mar, mas caminhos fantásticos e diversos que nos promovem em deriva, um corpo-olho. Cada movimento é uma descoberta.
Pois bem, encontramos o que todos procuravam: Atlântida, um arquipélago de mundos de Vânia Medeiros.
Thais Graciotti
Texto
(,)
Flávia: mas eu não vejo muito a água... apesar das ilhas.
Vânia: ... realmente.... pensando no processo, em nenhum momento eu pensei em água exatamente...
Flávia: quer dizer, essas ilhas elas nascem dessa mancha, dessas cores, mas assim, eu penso em mangue, nesse liquido denso, que é o nascedouro da vida marinha... turva.
Vânia: sim, um líquido denso. tem muita coisa sólida dentro dele.
Flávia: tem uma solidez.
Vânia: tem resíduos.
Flávia: lembro das aulas de geografia aquela coisa da formação sedimentar.
Vânia: sim, sedimentos.
Flávia: esse mar meio que tem uma estrutura, ele sustenta. é uma água que é quase um objeto.
Vânia: talvez não seja líquido esse mar. talvez seja apenas sem forma. como uma situação de errância. sem rumo.
Flávia: você fala errância, eu penso no que você disse mais cedo sobre a não existência ou existência de Atlântida, quer dizer, ela é uma criação e um erro... como a própria criação artística... outro dia eu estava conversando com Joaozito e ele me dizia, Flávia, as coisas não têm sentido, elas são experiência! os meus desenhos são o que acontece no momento e é o que te arrebata que importa! o que significa eu não sei. interessa o que provoca... eu acho lindo pensar o mar como um bloco... isso que você chama de ilhazinhas de calor... fico imaginando as explosões císmicas entre esses laranjas e amarelos pra essa ilha surgir... tem o branco também né?
Vânia: sim, o branco é outra história. Eu sempre tive uma admiração muito grande por pessoas que fazem as coisas de maneira simples, justamente pelo meu rebuscamento, meu excesso. um dia vi uma exposição de Leonilson e eles colocavam uma entrevista com ele no qual o entrevistador perguntava, Leonilson, porque você desenha as coisas e deixa todo esse espaço branco em volta delas, ele respondeu, o branco é por onde a pessoa entra. Aquilo me marcou muito, é de uma generosidade imensa, de um carinho com quem olha. Um vazio generoso.
Conversa com Flávia Bonfim em 4/11/2016