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Na sexta-feira, 20 de março às 19h, tem abertura na RV Cultura e Arte a exposição “Horizonte de eventos”, com obras inéditas da artista baiana Vânia Medeiros e curadoria de Valquíria Prates. Nesta nova mostra a artista apresenta um série de desenhos sobre papel, pinturas sobre lona, vídeo e esculturas nas quais investiga fenômenos de espaço e tempo em livros de geografia e física. Imagens de atlas escolares, fotografias de Marte feitas por satélite e textos sobre relatividade e causalidade temporal permeiam o universo imagético desta produção.
Em tempos de advento do terraplanismo, da retomada do criacionismo e outras teorias que desacreditam de postulados científicos que pareciam aceitos tacitamente pela sociedade, a artista busca, através de exercícios plásticos, reaprender em um processo de desconstrução que cria mais uma dobra entre ciência e imaginário.
"Horizonte de eventos celebra um eterno retorno ao desenho, que, em meu processo, é uma espécie de isca para jornadas de diversos tipos. É começo, meio e fim mesmo quando está absolutamente emaranhado de outras linguagens. Viajar, deslocar-se, está no meu trabalho de diversas formas - em traslados por ar, mar e terra, em processos em que flerto com outras áreas do conhecimento como a antropologia e as ciências em geral. Nesta exposição traço percursos por lugares imaginários como paisagens de Marte, arrisco cartografias em fractais, que se apoiam em vazios, investigo utopias coletivas como a Liberdade. O olhar arguto de Valquíria Prates, que realiza a curadoria, foi absolutamente fundamental para reconhecer as linhas que unem esses trabalhos entre si e de maneira mais ampla em minha trajetória", comenta Vânia.
"A curadoria da exposição se estende no tempo das conversas e na vontade de enfrentar o espaço generoso da galeria RV Cultura e Arte com a mesma intensidade que Vânia se coloca com muita precisão e objetividade em cada desenho, vídeo, livro, pintura, oficina, aula, residência ou seja lá qual instância de arte-vida partilhada no agora que integram em sua pesquisa uma espécie de "programa espacial", completa Valquíria.
Texto curatorial
Um programa espacial
Sempre que o espaço incita as investigações de artistas, nos vemos diante de questões que mobilizam interesses comuns entre arte, geografia, física e astronomia.
Em Horizonte de eventos, Vânia Medeiros partilha conosco o que poderíamos chamar de programa espacial, disparador de um conjunto de vivências que deram origem a obras recentes. Nelas, se fazem visíveis e sensíveis seus embates com o os usos do tempo (livre) e dos espaços (públicos).
Sozinha ou acompanhada de outros pesquisadores-colaboradores, Vânia se coloca em estado combustão a cada nova pesquisa que tem no desenho seu ponto de contato com a realidade. Em seu modus operandi investigativo, a artista agencia outros desejantes de integrar as etapas rigorosas e fluidas de seu programa de deslocamento por terra, água, ar, paredes e papéis – espaços gestados entre ficção e realidade.
Por exemplo, no exercício de desenhar lugares como ato de constituir mundos, na série Constituição. Feitos com fragmentos de mapas do Brasil recortados de livros didáticos, os territórios inventados pelo gesto da mão se conectam por manchas e linhas feitas com pigmentos minuciosamente impregnados pela artista, como testemunho de quem que já esteve naquelas superfícies quando as inaugurou no espaço do papel.
Na busca por recolher e registrar entendimentos e usos da noção de liberdade no filme e no livro do projeto O momento é meu | Der Augenblick ist mein, Vânia se desloca com a artista alemã Rebecca Budde por diversas cidades. Entre conversas, desenhos e registros do cotidiano em fotografias e vídeos, ambas buscam definições do que é ser livre como experiência entendida e praticada por outros, tendo nesses percursos o contraponto para as escutas de vivências de duas mulheres que viveram as privações do encarceramento.
Em O desenho como férias, projeto que se desdobra em fotografias e livros de artista, podemos ver paisagens que, ainda que testemunhadas pela fotografia, não desistem de ser desenho. Podemos pensar sobre o que significa para nós este “estado de férias”, já que faz parte do programa espacial da artista a possibilidade de nos darmos tempo para escolher o que fazer - com recursos para estar vivo de desejos e silêncios, de trocas e escutas. E para, principalmente, em suas palavras: “Cultivar um tipo específico de organização mental”.
Este cultivo do estado de férias nos prepara para nos lançarmos a outras empreitadas e, com Vânia, inventarmos e ocuparmos outros espaços públicos, quem sabe passando Férias em Marte, título do trabalho em que a pintura é feita com a força do corpo que ocupa cada milímetro quadrado da lona que lhe dá suporte. Ao nos projetarmos para Marte com ela, paisagem fictícia e nem por isso menos real, nos questionamos sobre quais os desejos dos terráqueos e suas ambições de deslocamentos para fora do planeta feito de terra e tijolo: os vivos da terra.
Atravessa a mostra uma vontade de desenhar a liberdade, contorná-la, lhe dar nomes e formas – aprender como se pode colocá-la em movimento, praticá-la. E aí reside a grande urgência de conversarmos sobre muitas das inquietações contemporâneas que partilhamos por estarmos vivos hoje, no Brasil, em 2020.
Enfrentar o espaço da exposição com a mesma intensidade que a artista se coloca em seu fazer-arte nos evidencia a precisão e objetividade que constitui cada desenho, vídeo, livro, pintura, e evoca ainda as oficinas, aulas, residências e tantas outras instâncias de arte-vida partilhada no aqui-agora.
Aventuremo-nos na corrida espacial de Vânia Medeiros.
Valquiria Prates
curadora
Na sexta-feira, 20 de março às 19h, tem abertura na RV Cultura e Arte a exposição “Horizonte de eventos”, com obras inéditas da artista baiana Vânia Medeiros e curadoria de Valquíria Prates. Nesta nova mostra a artista apresenta um série de desenhos sobre papel, pinturas sobre lona, vídeo e esculturas nas quais investiga fenômenos de espaço e tempo em livros de geografia e física. Imagens de atlas escolares, fotografias de Marte feitas por satélite e textos sobre relatividade e causalidade temporal permeiam o universo imagético desta produção.
Em tempos de advento do terraplanismo, da retomada do criacionismo e outras teorias que desacreditam de postulados científicos que pareciam aceitos tacitamente pela sociedade, a artista busca, através de exercícios plásticos, reaprender em um processo de desconstrução que cria mais uma dobra entre ciência e imaginário.
"Horizonte de eventos celebra um eterno retorno ao desenho, que, em meu processo, é uma espécie de isca para jornadas de diversos tipos. É começo, meio e fim mesmo quando está absolutamente emaranhado de outras linguagens. Viajar, deslocar-se, está no meu trabalho de diversas formas - em traslados por ar, mar e terra, em processos em que flerto com outras áreas do conhecimento como a antropologia e as ciências em geral. Nesta exposição traço percursos por lugares imaginários como paisagens de Marte, arrisco cartografias em fractais, que se apoiam em vazios, investigo utopias coletivas como a Liberdade. O olhar arguto de Valquíria Prates, que realiza a curadoria, foi absolutamente fundamental para reconhecer as linhas que unem esses trabalhos entre si e de maneira mais ampla em minha trajetória", comenta Vânia.
"A curadoria da exposição se estende no tempo das conversas e na vontade de enfrentar o espaço generoso da galeria RV Cultura e Arte com a mesma intensidade que Vânia se coloca com muita precisão e objetividade em cada desenho, vídeo, livro, pintura, oficina, aula, residência ou seja lá qual instância de arte-vida partilhada no agora que integram em sua pesquisa uma espécie de "programa espacial", completa Valquíria.
Texto curatorial
Um programa espacial
Sempre que o espaço incita as investigações de artistas, nos vemos diante de questões que mobilizam interesses comuns entre arte, geografia, física e astronomia.
Em Horizonte de eventos, Vânia Medeiros partilha conosco o que poderíamos chamar de programa espacial, disparador de um conjunto de vivências que deram origem a obras recentes. Nelas, se fazem visíveis e sensíveis seus embates com o os usos do tempo (livre) e dos espaços (públicos).
Sozinha ou acompanhada de outros pesquisadores-colaboradores, Vânia se coloca em estado combustão a cada nova pesquisa que tem no desenho seu ponto de contato com a realidade. Em seu modus operandi investigativo, a artista agencia outros desejantes de integrar as etapas rigorosas e fluidas de seu programa de deslocamento por terra, água, ar, paredes e papéis – espaços gestados entre ficção e realidade.
Por exemplo, no exercício de desenhar lugares como ato de constituir mundos, na série Constituição. Feitos com fragmentos de mapas do Brasil recortados de livros didáticos, os territórios inventados pelo gesto da mão se conectam por manchas e linhas feitas com pigmentos minuciosamente impregnados pela artista, como testemunho de quem que já esteve naquelas superfícies quando as inaugurou no espaço do papel.
Na busca por recolher e registrar entendimentos e usos da noção de liberdade no filme e no livro do projeto O momento é meu | Der Augenblick ist mein, Vânia se desloca com a artista alemã Rebecca Budde por diversas cidades. Entre conversas, desenhos e registros do cotidiano em fotografias e vídeos, ambas buscam definições do que é ser livre como experiência entendida e praticada por outros, tendo nesses percursos o contraponto para as escutas de vivências de duas mulheres que viveram as privações do encarceramento.
Em O desenho como férias, projeto que se desdobra em fotografias e livros de artista, podemos ver paisagens que, ainda que testemunhadas pela fotografia, não desistem de ser desenho. Podemos pensar sobre o que significa para nós este “estado de férias”, já que faz parte do programa espacial da artista a possibilidade de nos darmos tempo para escolher o que fazer - com recursos para estar vivo de desejos e silêncios, de trocas e escutas. E para, principalmente, em suas palavras: “Cultivar um tipo específico de organização mental”.
Este cultivo do estado de férias nos prepara para nos lançarmos a outras empreitadas e, com Vânia, inventarmos e ocuparmos outros espaços públicos, quem sabe passando Férias em Marte, título do trabalho em que a pintura é feita com a força do corpo que ocupa cada milímetro quadrado da lona que lhe dá suporte. Ao nos projetarmos para Marte com ela, paisagem fictícia e nem por isso menos real, nos questionamos sobre quais os desejos dos terráqueos e suas ambições de deslocamentos para fora do planeta feito de terra e tijolo: os vivos da terra.
Atravessa a mostra uma vontade de desenhar a liberdade, contorná-la, lhe dar nomes e formas – aprender como se pode colocá-la em movimento, praticá-la. E aí reside a grande urgência de conversarmos sobre muitas das inquietações contemporâneas que partilhamos por estarmos vivos hoje, no Brasil, em 2020.
Enfrentar o espaço da exposição com a mesma intensidade que a artista se coloca em seu fazer-arte nos evidencia a precisão e objetividade que constitui cada desenho, vídeo, livro, pintura, e evoca ainda as oficinas, aulas, residências e tantas outras instâncias de arte-vida partilhada no aqui-agora.
Aventuremo-nos na corrida espacial de Vânia Medeiros.
Valquiria Prates
curadora
Assista ao filme Der Augenblick is mein / o momento é meu parte integrante da mostra: